Com quase 400 mil hectares de área protegida, a Rebio do Lago Piratuba abriga espécies ameaçadas, como a onça-pintada e o peixe-boi-da-Amazônia. Seu acesso é restrito e a região é caracterizada por florestas de várzea, campos inundáveis e manguezais. A criação de búfalos, considerada de médio a alto impacto ambiental, compromete a preservação do ecossistema. Estima-se que a área concentre cerca de um terço das criações de búfalos do estado, aproximadamente 100 mil animais, prejudicando a formação de manguezais e pântanos salinos – áreas alagadas periodicamente pela água salgada ou salobra, com vegetação halófita.
Além de acabar com a pecuária irregular na área de proteção, o MPF atua na recuperação dos danos ambientais causados pelos animais. A iniciativa está alinhada à preservação de florestas e biodiversidade, tema central da 30ª Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas (COP30), que ocorrerá em novembro de 2025 em Belém (PA).
Durante a investigação, o MPF identificou a ocupação irregular de terras da União, com pecuaristas usando indevidamente o leito assoreado do rio e o interior da reserva para pastagem. Fiscalizações ambientais localizaram cerca de 15 mil búfalos dentro da reserva, além de cercas, cadeados e porteiras que bloqueavam o acesso às áreas públicas. Uma única pessoa ocupava mais de 4 mil hectares no leito seco do rio. Além de grandes pecuaristas, integrantes de comunidades tradicionais também mantinham búfalos na Rebio.
O MPF também constatou que o Estado, em parte, legitimava a movimentação ilegal de búfalos ao emitir Guias de Transporte Animal (GTA) sem verificar a procedência. Para corrigir isso, o MPF articulou com órgãos estaduais e federais a proibição da emissão de GTAs para entrada de búfalos na Rebio e recomendou o cancelamento de Cadastros Ambientais Rurais (CARs) que se sobrepunham à área protegida. A Secretaria de Meio Ambiente atendeu a recomendação, cancelando e suspendendo CARs irregulares e encaminhando outros 19 para análise.

Frigoríficos também foram orientados a não abater ou comercializar gado proveniente de propriedades dentro da reserva ou no leito assoreado do Rio Araguari. Em parceria com ICMBio e SPU, o MPF tem identificado pecuaristas para propor Termos de Ajustamento de Conduta (TACs). Em 2025, dois TACs já foram assinados, comprometendo os criadores a retirar rebanhos e estruturas irregulares, permitindo a regeneração natural da vegetação.
O MPF também promove a transição de comunidades tradicionais que vivem na Rebio para práticas sustentáveis, como piscicultura, cultivo de açaí, criação de abelhas para produção de mel e confecção de biojoias. “As famílias compreenderam que o impacto da pecuária não se limita ao meio ambiente, mas afeta diretamente suas vidas”, explicou o procurador Milton Souza.
A criação irregular de búfalos já afetou outras regiões do estado, como o arquipélago do Bailique, onde o peso dos animais abriu canais no solo argiloso, alterando o curso do Rio Araguari e intensificando a erosão que ameaça comunidades locais.
Com a retirada gradual dos rebanhos e a adoção de medidas conjuntas, o MPF busca transformar a Rebio do Lago Piratuba em um exemplo de recuperação ambiental, restaurando a biodiversidade e incentivando práticas sustentáveis em consonância com os compromissos da COP30.