Resistir, absorver, adaptar-se e recuperar-se. Alunos da Escola Municipal João Queiroga, no município de Laranjal do Jari, no Sul do Amapá, estão a participar do projeto pioneiro no Amapá “Defesa Civil na Escola: Aprender para Viver”. O poder público de Laranjal pretende transformar o colégio em uma referência de aprendizado e resiliência comunitária. Os estudantes serão capacitados, junto à comunidade escolar, para enfrentar os desafios ambientais e de saúde decorrentes de eventuais adversidades naturais.
O município é o terceiro maior do Amapá, com 52.302 habitantes, segundo o IBGE. E é o terceiro maior produtor de castanha-do-Brasil do estado. A região que compõe o município possui uma diversidade de fauna e flora exuberantes, como a Estação Ecológica do Jari, uma Unidade de Preservação federal.
2000: O RIO QUE PASSOU NA VIDA DO LARANJAL…
A cidade é banhada pelo Rio Jari, que possui quase 800 km de extensão e que já causou uma tragédia tão extensa quanto o seu tamanho no ano 2000. Segundo o prefeito Márcio Serrão (União), as águas do rio subiram a um nível sem precedentes, causando uma grande inundação que afetou principalmente os moradores de áreas de ressaca e os ribeirinhos.
O nível do Rio Jari subiu 3,32 metros além do normal, o que movimentou o Amapá em prol de Laranjal. A cheia de 2000 é lembrada como um dos eventos naturais mais graves da história do Amapá. Em 2022, o município sofreu com a fúria da natureza mais uma vez. O nível do rio chegou a 3,19 metros, quase a mesma medida que no ano de 2000. Foi preciso muita resiliência na vida dos laranjalenses. para que a vida, gradativamente, fosse voltando a uma normalidade aceitável.
Não são apenas as duas maiores fatalidades que ocorreram no município que vão servir de base para a condução da metodologia do projeto da Defesa Civil do município. O programa inclui exemplos de outras cidades que já enfrentaram desastres climáticos e que a resiliência coletiva, a solidariedade e a reciprocidade foram fundamentais para a reconstrução não somente da cidade, mas da vida das pessoas.
A tragédia climática que vem consternando o Brasil, as inundações no Rio Grande do Sul, infelizmente é um exemplo para esse modelo de prevenção e mitigação de desastres. Os alunos terão atividades teóricas e práticas que abordam temas como cidadania, meio ambiente, segurança global e gestão de riscos e desastres. Eles serão capacitados também, dentro dos limites de segurança, para atuar de forma eficaz na cautela o e na atenuação de desastres, alinhando-se com a Política Nacional de Proteção e Defesa Civil (Lei 12.608/2012).
Essa abordagem multidisciplinar é alinhada com a campanha global da Organização das Nações Unidas (ONU), a Making Cities Resilient (MCR30), ou Construindo Cidades Resilientes, enfatizando a importância de comunidades bem-informadas e preparadas. No caso, a ONU possui uma sistematização de preparo para cidades resilientes mais ampla, como governos federais
O projeto “Defesa Civil na Escola: Aprender para Viver” é fruto de uma colaboração entre a Secretaria Municipal de Educação, a Defesa Civil Municipal, a Escola Municipal João Queiroga de Souza, a Secretaria Municipal de Saúde e a Secretaria Municipal de Meio Ambiente. Essa abordagem multidisciplinar e colaborativa é essencial para garantir a eficácia e a sustentabilidade das ações propostas.
A execução deste projeto de forma colaborativa é inédita no estado do Amapá, representando um marco na integração de políticas públicas em prol da saúde e segurança da população. A iniciativa promete não só preparar melhor os estudantes e a comunidade para enfrentar desastres, mas também servir de modelo para outras cidades da região.
Com esse projeto, Laranjal do Jari avança na construção de uma comunidade mais preparada e resiliente, mostrando que a educação e a prevenção são caminhos essenciais para enfrentar os desafios ambientais e de saúde pública.
APRENDIZADOS RESILIENTES
Cidades resilientes são aquelas que têm a capacidade de resistir, absorver, adaptar-se e recuperar-se de maneira eficiente e rápida dos efeitos de desastres naturais ou situações adversas. Elas conseguem minimizar riscos e perdas de vidas e patrimônio, preservando e restaurando suas estruturas e funções essenciais.
A resiliência urbana envolve planejamento e infraestrutura adequada, governança eficiente, educação e engajamento comunitário, além de sistemas de resposta eficazes para enfrentar emergências e desastres.
O projeto “Defesa Civil na Escola: Aprender para Viver” está interligado com outros Brasil afora, semelhantes em concepção e atuação. Independente do nível socioeconômico, se residem na capital, ou no interior, são alunos, professores, membros da Defesa Civil, entre outros, que têm o desígnio de ser resilientes como puderem para estender as mãos e acolher.
Em Belo Horizonte (MG), a Defesa Civil Municipal está envolvida no programa, promovendo a educação sobre resiliência e segurança em desastres entre estudantes do ensino fundamental e médio.
No município de Nova Iguaçu (RJ), o projeto “Escolas Seguras: Desenvolvendo a Resiliência através da Educação (ES-DRAE) também habilita os estudantes a compreender de forma mais pedagógica não apenas a resiliência no contexto de desastres ambientais, mas também levando às suas comunidades o que aprendem nas escolas sobre resiliência coletiva.
No Piauí, a cidade de Pedro II, conhecida como a “Suíça Piauiense”, devido ao seu clima serrano e frio e que contrasta com o calor característico do interior do Nordeste, também educa seus alunos quanto à resiliência devido a danos graves sofridos por razões climáticas. Em março de 2023, a prefeitura decretou calamidade pública devido às fortes chuvas que afetaram o município, causando enxurradas nas zonas urbana e rural, rompendo estradas isolando o município.
Em Manaus (AM), mais de 300 alunos residentes em áreas de risco foram certificados como “Defensores Comunitários”, reforçando a conscientização sobre prevenção de desastres.
O estado de Santa Catarina tem uma ampla participação em projetos que divulgam, ensinam e praticam a resiliência comunitária. Em torno de 185 municípios, de 295, que envolvem cerca de 30 mil estudantes, a Defesa Civil capacita os professores para incluir temas de defesa civil e prevenção de desastres nas disciplinas regulares.
Essas cidades, algumas das quais enfrentam desafios socioeconômicos significativos, se beneficiam do projeto ao promover uma cultura de prevenção e resiliência desde cedo, preparando melhor as comunidades para lidar com emergências e desastres naturais.
DCNAPV e MCR2030: DIFERENTES, PORÉM IGUAIS
O projeto “Defesa Civil na Escola: Aprender para Viver” e o programa da ONU “Construindo Cidades Resilientes 2030” (MCR2030) têm objetivos e abordagens semelhantes e complementares, ambos focados na construção de comunidades mais resilientes e preparadas para enfrentar desastres. Porém, têm diferenças organizacionais, como a dimensão que cada programa possui.
Através de atividades educativas, o programa da Defesa Civil busca criar uma cultura de prevenção e resiliência desde a infância, capacitando futuros cidadãos para agir de forma informada e segura diante de emergências.
O programa global da ONU também enfatiza a importância da educação e conscientização, mas em uma escala mais ampla, envolvendo todas as partes interessadas da comunidade, incluindo governos locais, instituições e a população em geral. O MCR2030 busca melhorar a compreensão dos riscos e promover a implementação de estratégias de resiliência urbana.
O projeto “Defesa Civil na Escola: Aprender para Viver”, capacita professores e alunos para que possam atuar na gestão de riscos e desastres, integrando esses conhecimentos nos currículos escolares. O objetivo é preparar a comunidade escolar para agir de forma preventiva e coordenada durante eventos adversos.
O MCR2030 fornece ferramentas e metodologias para que cidades e governos locais possam planejar e implementar ações de redução de riscos e resiliência de forma estratégica e integrada. O programa oferece um roteiro claro para que as cidades possam avançar em suas capacidades de gestão de desastres.
O projeto inédito de Laranjal foca na redução de vulnerabilidades ao aumentar o conhecimento e a capacidade de resposta da comunidade escolar, contribuindo para uma população mais bem informada e preparada para lidar com desastres.
O MCR2030 Facilita a criação de redes de aprendizagem e colaboração entre cidades, entidades participantes e outros stakeholders, promovendo uma abordagem integrada e coordenada para a resiliência urbana.
Em resumo, ambos os programas compartilham a visão de fortalecer a resiliência das comunidades através da educação, capacitação e implementação de estratégias eficazes de gestão de riscos e desastres.
Enquanto o “Defesa Civil na Escola” foca especificamente na educação de jovens e na integração desses conhecimentos na comunidade escolar, o “MCR2030” atua em uma escala mais ampla, envolvendo múltiplos níveis de governo e diferentes setores da sociedade para promover cidades mais seguras e resilientes.
A campanha da ONU ainda é apoiada por um conjunto de “Dez Passos Essenciais” para guiar os municípios na implementação de medidas de resiliência, que incluem desde a avaliação de riscos até o fortalecimento de sistemas de alerta precoce e a construção de infraestrutura resiliente.